sexta-feira, dezembro 22, 2006

Eu sou do Inter

Esta é a segunda vez que me sento para escrever sobre o Sport Club Internacional. Na primeira eu era apenas uma criança de oito anos de idade. Lembro-me de arrastar a pesada máquina de escrever para a mesa da sala. Depois do enorme esforço para erguê-la, coloquei o papel e, com tinta vermelha, escrevi o título: “Celeiro de Ases”.
Acho que esse foi o primeiro momento que parei e pensei “sim, eu sou do Inter”. Mas já estava tudo escrito, desde a primeira vez que fui ao Beira Rio, com quatro anos de idade. O jogo era Inter e São Luís de Ijuí pela semi-final do Gauchão, ou coisa que o valha. Meu pai, o grande responsável por tudo, me dizia “aqui é a nossa casa”, e eu nunca vou me esquecer de como era grande essa casa. Não me lembro de ter visto o jogo, eu estava mesmo impressionado com o mar de camisas vermelhas que tomava as arquibancadas. Segurando na mão daquele guia pelos mistérios do futebol eu ouvia histórias do tipo “quando a gente foi campeão em 75 eu estava sentado ali”, “quando nós ganhamos o gre-Nal tal eu estava lá daquele lado”, “eu e teu tio trouxemos tijolos para ajudar a construir esse estádio”.
Pois desde aquele dia que resolvi escrever o hino, dediquei grande parte da minha vida ao Colorado. Lembro de quando perdemos para o Flamengo naquela final que não se sabia direito se era Campeonato Brasileiro ou não. Lembro do gre-Nal do século, daquele time que parecia imbatível, mas que acabou perdendo para o Bahia. E no ano seguinte, como esquecer, toda a insistência para que meu pai me levasse naquele Inter e Olímpia. E depois a tristeza e pela primeira vez na vida a flauta no colégio.
Lembro também de quando comprava o álbum de figurinhas e a primeira coisa que fazia era colar a página do nosso adversário ali da Azenha. Raramente jogava bafo com meus colegas para não correr o risco de pegar um jogador “deles”.
Lembro do quanto chorei quando vi o Inter pela primeira vez campeão, em 1991. Aquele povo invadindo o gramado, e depois a festa nas ruas, a volta para Caxias com bandeiras vermelhas por todos os cantos são imagens que vão ficar para sempre comigo.
Lembro de quando pela primeira vez vi o Inter ser realmente grande e conquistar o Brasil com aquele pênalti mal batido do Célio Silva. Lembro de chorar abraçado ao meu irmão. Ainda éramos duas crianças de 12 e 9 anos de idade, mas já sentíamos a responsabilidade de vestir aquela camiseta vermelha e dizer “sim, eu sou do Inter”.
Foram momentos de glória que precederam uma década do inferno. Enquanto torcíamos para que o Colorado ganhasse um joguinho sequer com Rudinei e Demétrio no ataque, eles estavam lá enfileirando copas do Brasil. Enquanto ganhávamos o título do Gauchão “interminável”, um campeonato ridículo, eles estavam lá ganhando a Libertadores. Eu não queria mais ir para a aula. Eu não queria mais sair de casa.
Mas toda quarta-feira ou domingo que tivesse jogo nós descíamos de Caxias rumo ao Beira Rio. No carro iam sempre meu pai, o Baltazar, o Tubelo, eu, meu irmão e algum outro que de vez em quando entrava de carona. Como esquecer das inúmeras churrascadas na Saci? Das cadeiras do estádio com nosso nome gravado? Das comemorações e das tristezas?
Lembro do gol do Fabiano naquela final do Gauchão de 1997. E depois dele dançando após marcar mais um no gre-Nal dos 5 a 2.
Lembro agora do Inter quase rebaixado, das noites solitárias e frias na Coréia, e de como ficava indignado com as vaias. Lembro do Beira Rio quase vazio, naqueles jogos que nada valiam. Mas sabíamos que se quiséssemos voltar a ser grandes tínhamos que passar por aquilo.
Desde então vimos o Inter crescer, se organizar e pensar no futuro. Primeiro retomamos a hegemonia no Estado. Depois veio a classificação para a Copa Sul-Americana. Os jogos contra o Boca Júniors. Vice-campeão Brasileiro após a roubalheira a favor do Corinthians. Todos sentíamos que alguma coisa nos aguardava, mas seguíamos morrendo na beira da praia, uma verdade que doía de ser ouvida da boca de nossos adversários.
Veio 2006 e lembro do jogo arrasador contra o Nacional do Uruguai no Beira Rio. Mas lembro também da final do Gauchão que perdemos, em casa, para nosso maior rival. Mais flauta e muitas dúvidas. Será que vamos ficar mais um ano nessa? Não vamos ganhar nada de novo?
Lembro do sofrimento para passar pelo Nacional nas oitavas de final. Da angústia durante a Copa do Mundo. Quem queria saber do Brasil se o Inter precisava ganhar da LDU? Lembro do alívio que veio dos pés de Rafael Sobis e Rentería.
Depois mais uma vez um time paraguaio na semi-final e o fantasma do Olímpia rondando a cabeça dos colorados. Mas nós temos Alex e temos Fernandão, e uma torcida enlouquecida que transforma o Gigante em um caldeirão para nossos adversários.
Lembro do jogo de ida contra o São Paulo e todos meus amigos nervosos aqui na cozinha, grudados na tevê. Um jogo pegado, disputado palmo a palmo, onde brilhou a estrela de Rafael Sobis. O Rio Grande tremeu junto com as redes do Morumbi e ali nós já sabíamos que ninguém ia nos tirar esse título.
Lembro da confusão para entrar no Beira Rio no dia da grande final. De quando eu encontrei minha família nas catracas e praticamente invadimos o estádio, que é nossa casa, nosso templo. Já estávamos chorando antes mesmo de começar o jogo, abraçados em frente ao bar do portão 6, eu, meu pai e meu irmão. Do jogo nem preciso falar, do grito que não saída da garganta, e sim dos olhos, porque aqueles mais de 50 mil colorados eram todos crianças e dançavam, choravam, se abraçavam e pintavam a América de vermelho.
Lembro de tudo isso porque essa semana voltei ao Beira Rio. E aquele estádio gigantesco que meus olhos de criança viram há muito tempo parecia pequeno demais. Não tinha jogo, não tínhamos adversários. Era o mundo que encontrava sua casa, carregado pelos braços de Fernandão, de Clemer, de Luís Adriano, o legítimo colorado, de Gabiru. Era o mundo conquistado pelo presidente Fernando Carvalho, pelo Abelão, pelo Paixão. Era o mundo do cara do bar, do vendedor de cachorro quente. O mundo do poderoso executivo, do advogado, do catador de lixo, do operário. Era o mundo do peão de estância, que acompanhou tudo grudado no seu radinho. Era o mundo do meu bisavô, Alberto Morem, do Baltazar, do João, meu colega, e de tanto outros que se foram antes. Enfim, era o meu mundo, desse coração Colorado que segue chorando toda vez que a Academia do Povo pisa no gramado, desse distintivo marcado para sempre na pele, dessa camisa vermelha, que é manto sagrado, dessa religião que sigo como mais abnegado devoto.
Sim, eu sou do Inter. E se sempre tive orgulho de dizê-lo, agora repito ainda mais alto, porque o mundo inteiro tem que escutar: EU SOU DO INTER!!!

quinta-feira, dezembro 07, 2006

Um sonho rocker

Infelizmente tenho confundido um pouco sonho com realidade.
Há alguns minutos estava numa livraria de Buenos Aires, conversando com um comunista, com certeza comunista porque usava uma camisa vermelha com a foice e o martelo, e que muito provavelmente devia ser o dono da loja. Me lembro de ter pedido um livro de Luís Carlos Borges. Sim. Aquele maldito comuna me fez confundir Luís Carlos Prestes com Jorge Luis Borges, em uma livraria castelhana. O pior é que ainda me dei conta e corrigi. Comprei o livro e saí para dar uma volta num brique antigo onde as pessoas dançavam tango na rua.
É isso que eu falo em confundir sonho com realidade. Como é que eu posso ter me confundido e depois ter concertado tudo num sonho? Ou seja, eu estava plenamente consciente do que fazia, tanto quanto acordado.
Quando preparava meu chimarrão esta manhã tenho certeza de que estava mais fora do que dormindo. Pensava nas possibilidades de as pulgas tomarem conta do meu apartamento e exigia uma resposta do cachorro, porque afinal é ele o saco de pulgas. Como o cusco, no máximo, me olhava com aquela cara triste, desisti de tentar entender o mundo das pulgas e resolvi pensar em outra coisa abstrata, mas que toma a maior parte do meu tempo de atividade intelectual: Rock and Roll.
Me custa acreditar que o Rock morreu, mas é uma realidade cada vez mais difícil de refutar. Não que ele esteja morto e enterrado, que ninguém vá mais ouvir e tocar. Até acho que hoje em dia existem mais pessoas que se dizem rockers do que antigamente. Nunca se vendeu tanta guitarra, nunca existiram tantas bandas, tantas lojas, tantos bares. Mas a questão é que tudo isso parece ser muito falso. Não existe um objetivo. Esta nova geração, da qual infelizmente faço parte, não tem nada a dizer. Está certo que mudar o mundo através da música, sonho de nossos antepassados, já foi provado que não é possível. Mas o fato de tentar é que era apaixonante.
O Rock, Rock mesmo, morreu exatamente no momento em que o palhaço do Kurt Cobain enfiou uma bala na cabeça. Definitivamente ele foi o último Rock Star digno dessa classificação. Se bem que de certa forma fracassado, porque não conseguiu morrer de overdose ou de tanto beber como os grandes Rock Stars dos anos 60 e 70, e teve que apelar para um balaço de revólver.
Desde então o Rock deixou de ser a principal categoria de música do mundo e passou para a história. Estamos no mesmo nível do jazz, do blues, da música clássica e erudita. Sempre vai existir, mas será exclusividade de um pequeno grupo de entendidos, estudiosos e interessados. Ou seja, o Rock cumpriu a sua obrigação como um capítulo da história da cultura, agora deixemos que outras coisas tomem o seu lugar.
Essa constatação está em todos os lugares. Vejamos o último show do Deep Purple aqui em Porto Alegre. Foi tranqüilamente um dos cinco melhores shows de rock que já vi, mas foi um fracasso de público. Pete Thousand estava certo quando disse que “os jovens só nos querem ver uma vez”, porque é isso mesmo, é só para no futuro poder dizer aos seus filhos “eu vi um show do The Who”, ou “eu vi um show do Deep Purple”, é a mesma coisa. Pouca gente está lá pela música, a maioria vai pelo ícone que aqueles velhos representam. É algo como um souvenir intelectual que a juventude precisa ter para assegurar-se de que algum dia já foi jovem.
E aí mesmo é que está nossa decadência, a prova de nossa geração perdida, porque não temos nossos próprios ícones, não temos ninguém em quem confiar nossos sonhos, porque ninguém mais fala de sonhos de verdade, só dessa realidade insossa, sem graça e melancólica. O mal da nossa geração é que não temos futuro, ninguém nos dá uma luz de futuro. Este era o papel do Rock, até mesmo do Rock de Kurt Cobain, que dizia que o futuro é uma merda, mas pelo menos existia. Hoje parece que chegamos no máximo. Tudo o que pode acontecer é diminuir o tamanho do meu computador ou do toca discos, mas as estruturas estão dadas e nada vai mudá-las.
O nosso fracasso é que não temos nada a dizer. As pessoas têm se preocupado demais em criar um novo som, mas se esquecem de o som foi sempre o mesmo. A guitarra tem aquelas notas e era isso. A verdadeira questão está no sentimento e nas palavras. Nossa juventude não tem mais nada a dizer porque parece que tudo já foi experimentado, já foi dito e já foi vivido. Estamos aqui só de passagem, em busca de algum dinheiro e uma vida segura.
Eu, infelizmente, sigo sonhando e sigo rocker. Não que eu tenha escolhido, foi uma coisa que simplesmente aconteceu. Só espero que este não seja um sonho individual, que as pessoas ainda acreditem num mundo melhor. Não precisa ser através do Rock and Roll. Já estou conformado em tocar para mesas e cadeiras de um bar vazio a vida inteira, mas o sonho é o importante. Assim como aquela pichação, num muro qualquer, de uma cidade qualquer: “mais vale um sonho rocker do que essa realidade sem sentido”.

terça-feira, outubro 31, 2006

Emprego: piada de mau gosto

Dessa vez fiquei brabo mesmo. Será que só eu penso assim?
Vamos simplificar o cálculo para vislumbrarmos o tamanho do desastre. Suponhamos que o Brasil, nosso glorioso país do futuro, tenha 180 milhões de habitantes e uma taxa de desemprego média de 10%. Nessa visão otimista do quadro nacional, temos que 18 milhões de pessoas não têm fonte de renda nenhuma. A Organização Internacional do Trabalho estima que um terço da população mundial está “desempregada e subempregada”.
Enquanto isso, todos os dias os jornais publicam estudos que demonstram o quanto estamos destruindo nosso planeta. É ponto pacífico, não só entre ambientalistas, que a Terra não suportará este modelo de “desenvolvimento”. Tanto que 179 países assinaram a famosa Agenda 21 durante a Rio 92, ratificada 10 anos mais tarde na Cúpula de Joanesburgo. Mas entre assinar e fazer alguma coisa há uma grande diferença. Já sentimos na pele as mudanças climáticas, a morte dos rios, da terra, dos oceanos, e com eles os seres vivos.
Este contexto serve para demonstrar que não existe, nem haverá, emprego para todo mundo. Pela simples razão de que o planeta não agüentaria. Nosso conceito de trabalho e bem-estar social é incompatível com a sobrevivência da nossa espécie. Para que se mantenha o padrão de vida de uma minoria, sacrificam-se vidas, não só deste nosso tempo, como das gerações futuras.
As promessas de emprego são um engodo aplicado pelas elites de direita e esquerda. O que eles querem?
ESCRAVOS!!!
Escravos que sustentem seus projetos políticos de poder. Trabalhadores no limite da sobrevivência que produzam luxos para uma ínfima parcela da população. E o pior: nos fazem acreditar que a melhor coisa que pode acontecer na vida de um ser humano é conseguir um emprego; passar 80% do seu tempo trabalhando para o enriquecimento alheio; morrer de cansaço, de fadiga; tornar-se um dependente de drogas químicas que aliviam as “doenças do homem moderno”.
É uma palhaçada, e o pior é que não vejo saída para essa situação. Se alguém souber, que se manifeste.

sexta-feira, outubro 13, 2006

Campanha contra o "Trabalho"

A partir desta data, esse humilde blog lança sua campanha contra toda e qualquer forma de "Trabalho". Segundo nosso entendimento, Ele representa uma ditadura mais implacável que quelquer outra vista até hoje. Pior, Ele não tem personificação, é um fantasma que domina corações e mentes em todo o mundo, muito mais que o medo dos terroristas árabes e cruzados. Mata muito mais que todas as guerras juntas. Aniquila culturas. Cria doenças.
Mas como não podemos deixar o bom humor de lado, começamos a campanha com uma suave crônica. Um abraço.
Alternativa viável

Malditos cinco minutos. E maldito seja o cidadão que teve a genial idéia de colocar a ferramenta "soneca" em todos os despertadores do mundo. A tentação é muito grande. O pequeno prazer de dormir só mais um pouquinho é logo substituído por uma feroz luta entre corpo, colchão, mente, travesseiros e cobertas. E os cinco minutos logo viram dez, que viram quinze, vinte, e já não vou tomar banho, trinta, café da manhã pra quê?, só mais um e já está decretado o atraso.
Pronto, outro dia que começa cheio de resmungos e mau humor. Água, água, água na cara e nada resolve. Este saco de ossos e músculos é arrastado novamente, quase inconsciente, para toda aquela infinidade de compromissos inúteis e sem graça que levam a vida.
O verdadeiro ópio do povo é o trabalho. A ilusão do emprego movimenta corações, mentes e toda a força disponível para algo impossível: não existe mais lugar para todo mundo. Governos são eleitos por esta ilusão. Chega a ser quase uma ditadura, como já havia percebido há um bom tempo Debord. Quem tem trabalho vive por ele, quem não tem vive pelo sonho dele.
Vejamos um escritório normal de uma empresa qualquer. Quantas pessoas realmente gostam de estar ali? Dependendo do dia ninguém. Talvez quando acontece alguma coisa muito boa na sua vida particular estas pessoas até nem se importem de trabalhar. Mas daí a realmente gostar do que está fazendo tem um bom caminho.
Ainda por cima começa a chover. Aquela chuvinha chata, de prenúncio de outono. Dias abafados e úmidos. Agora, além de mal humorado, fedido, atrasado e com fome vou chegar molhado. Tudo bem, já estou quase anestesiado.
Abro a porta e todos me olham. Nada de grandes problemas, afinal vou ocupar, no máximo, uns quinze segundos da mente de cada um. Talvez um pouco mais do meu chefe, que vai querer algum tipo de explicação. Só para constar.
Olhando a tela do meu computador não posso deixar de admirar os mendigos. Eles sempre estarão ali para nos lembrar que temos uma alternativa viável.

Reflexões sociológicas sobre a pornografia

Tudo me leva a crer que as atrizes de filmes pornô realmente gostam do que fazem. É claro que em algumas cenas torna-se nítida a simulação do orgasmo. No entanto a maioria parece atingir o clímax durante as filmagens. O que pode ser considerado bastante normal, já que uma vez aceitas as condições em que é realizado o sexo (luzes, câmeras, equipe, cenário,etc.), é inegável a sensação do prazer que ele proporciona.
Esta é a sua grande contribuição: prazer. A indústria de filmes pornô contribui, em altas porcentagens, para a felicidade geral. E não digo simplesmente daqueles que fazem o uso clássico, que não cabe aqui explicar. O gênero infiltrou-se na sociedade, principalmente após sua popularização decorrente da exposição em vídeo locadoras e exibição em quartos de motel. A partir de então todas as pessoas sentem-se livres para exigir o máximo, em termos de satisfação, de seu parceiro.
Além disso, práticas antes censuradas tornaram-se parte integrante de qualquer ato sexual que se preze. Exemplo disso é o impacto que teve o filme “Garganta Profunda” nos anos 70. Pode-se dizer que este foi o primeiro representante pornô a quebrar a barreira do gueto a que eram relegados estes filmes. Devido a sua grande repercussão ele andou circulando por salas respeitáveis do meinstream cinematográfico. Como bem explicita o título, a obra é uma ode ao sexo oral. E me digam: há alguém hoje que não pratique esta modalidade?
Acredito que posso dizer que a indústria de filmes pornográficos é um dos pilares da nossa sociedade. Vejamos: a indústria pornô de São Fernando Valley, na Califórnia, movimenta um negócio que oscila entre 4 e 13 bilhões de dólares ao ano, só nos Estados Unidos. São 11 mil filmes e 6 mil empregos diretos (1200 atores). Imaginem então a rede de negócios que movimenta: representantes de vendas, locadoras, revistas especializadas, cinemas, canais de TV, etc...
É claro que algumas pessoas poderão apontar o lado negativo dessa popularização, ou seja, podem acusar a indústria de contribuir para a banalização do sexo. O que de fato concordo. É uma banalização benéfica em nome do prazer. As pessoas são nitidamente mais felizes com o sexo livre.
Outro grupo que não deve gostar muito dos filmes é o das prostitutas. Além de perderem um considerável mercado, o que é muito difícil estimar, elas são vítima de um golpe moral. Sim, nossas queridas “mulheres da vida” pouco a pouco perderam seu status de professoras do sexo. Eu, por exemplo, já faço parte de uma geração de iniciados pela TV. Os pais vêm-se livres da obrigação de levar seus filhos aos prostíbulos: basta passar numa locadora que está ali uma série de vídeo-aulas à disposição. O encontro com prostitutas dá-se somente perante a curiosidade, já que atualmente todas as pessoas estão dispostas às mais diferentes práticas sexuais.
Pois bem, até os conservadores da moral e bons costumes devem agradecer à indústria do cinema pornográfico. Casais satisfeitos, sexualmente falando, tendem a ter uma relação mais estável. Se não, pelo menos são todos mais felizes.

terça-feira, setembro 19, 2006

7 de Setembro

Meio atrasado mas vale. É a minha visão do que aconteceu no dia máximo da nossa "grandiosa" Pátria.

Dia de povo nas ruas, pipocas, cachorro quente e passe livre. O “sempre chove” não se confirma este ano; exceção para a regra. O sol que nasceu tímido detrás das nuvens começa a aquecer as calçadas neste fim do inverno. A cidade se prepara para os desfiles.
Na Perimetral os milicos já têm tudo organizado. Palanque para as autoridades e fita de contenção para os normais. Cavalaria, uniformes, banda, bandeiras e ordem. “Um, dois...”, o locutor testa seu microfone. Caixas de som amplificam sua voz por todos os quilômetros da avenida. Duplas de policiais guardam as esquinas da redondeza. Caras fechadas e muita compenetração para que não saia nada errado.
Em frente à Prefeitura outro espetáculo começa a tomar forma. São pequenos grupos de jovens que conversam a boca pequena. Cartazes, faixas, Che Guevara, violões e bandeiras. Ônibus chegam carregados de camisas vermelhas. São os movimentos sociais em ação: sem terra, sem casa, sem comida, sem educação, sem segurança. Eles e mais alguns curiosos do sem nada o que fazer.
Os alto-falantes anunciam: “5º Regimento de infantaria, 1º Batalhão,”. Pan, pan, pan... as botas encontram violentamente o asfalto. O efeito é aterrador. Crianças olham boquiabertas, sem conseguir sequer respirar. Alguns adultos balançam seu pavilhão nacional, orgulhosos do País. Em frente ao palanque os soldados batem continência ao Governador. Depois de um breve instante voltam-se com seus olhos pregados no infinito a marchar em meio à população.
Enquanto os músicos sobem no carro-palco-palanque, uma senhora de voz esganiçada conclama os presentes. A esta hora os grupos já são uma pequena multidão. Novas faixas são abertas, bandeiras são desfraldadas e siglas aparem. “Caminhando e cantando e seguindo a canção...” como um hino ainda embala as passeatas. E a letra fácil escorrega das bocas em uníssono. Todos cantam, muitos dançam e nos olhos parece brotar uma esperança genuína de alguma coisa qualquer.
Jovens sobem em canteiros, em ombros, em árvores. Dos prédios a cada pouco chove papel picado. Armas lustrosas encantam a todos pelo movimento dos oficiais. Jatos da Força Aérea sobrevoam o desfile com seu barulho ensurdecedor. Nos bastidores um exército de panfleteadores contribuem com o emprego dos garis. Todos os políticos candidatos estão ali, nos cartazes, nos folhetos e na lapela dos mais empolgados.
Das janelas dos apartamentos surgem cabeças desconfiadas que acompanham a serpente humana pela avenida. Dos gritos de guerra distingue-se pouca coisa. “Fora corruptos, fora FMI, fora Estados Unidos; mais terra, mais oportunidades, mais educação” De longe tudo parece uma grande festa, bastante colorida e animada. Dez policiais e duas viaturas guiam o povo pelas ruas do Centro.
Finalmente vem a cavalaria. Animais lustrosos e fardas engomadas reluzem sob o sol. Lanças e bandeiras de regimento dançam sobre as cabeças. A banda toca e as ferraduras acompanham seu ritmo com um barulho ensurdecedor. A demonstração de grandeza arranca aplausos e vivas da população. Retiram-se as fitas e o formigueiro se espalha desviando das bostas rumo aos parques e às casas.
Logo depois chega a marcha. Gritos para o palanque já vazio. Os tênis e as havaianas desfilam para ninguém. Pisoteiam o lixo e também desviam as bostas.
No ar a estranha sensação de que o povo e os políticos assistiram ao desfile errado.

quinta-feira, setembro 14, 2006

Vergonha

É fato: eu sinto vergonha. Menos mal, pois muitos sentem ódio, nojo, desprezo......


Era meia noite e eu, cansado dessas velhas paredes, resolvi dar uma volta. Só tem um cigarro que me dá mais satisfação do que o de após as refeições: aquele que compartilho com o vento frio da madrugada. E realmente naquela noite o Minuano não se fazia de rogado. Cortava roupas e a pele, feria o rosto e maltratava as articulações.
Boa solidão esta da madrugada. Nenhum carro, nenhuma gente. Apenas alguns poucos pensamentos que vazam das luzes ainda acesas nos apartamentos. Nada de cachorros, nada pombas, uns poucos ratos e sempre as mesmas baratas. São as ruas pequenas que fazem as grandes cidades, que escondem essa magia invisível, prestes a desabar. Os postes deixam tudo meio amarelo e as sombras guardam bem suas portas. Uma vida por trás de cada detalhe. Novas cidades só serão grandes quando tiverem história, casas antigas e ruas aconchegantes.
Mas logo adiante encontrei a avenida. Branca, insípida, morta, porque respira tudo o que pode durante o dia. Grades e cortinas de ferro protegem seus pequenos tesouros. Mas mesmo aqui, nada de cachorros, nada de pombas, um pouco mais de ratos e as mesmas baratas. Sim, também tem aquilo que a muito custo ainda é gente. Velhos bastante fortes para o álcool dormem sob as marquises. Amontoam-se no mesmo colchão de espuma, desmaiados e aquecidos pela iminência da morte. Estão ali, jogados, e despertam fácil um sentimento de repulsa e compaixão. Em meio às rugas seus olhos clamam por alguma coisa qualquer. São o povo do “não”: moedinha, “não”: uma comida, “não”: um sorriso que seja. Povo da agonia lenta e de mão única para o fim. Enquanto isso bebem e dormem, e acordam para beber e dormir.
E são também crianças, que colocam medo nos mais velhos e teorias nos palanques. Perderam tudo o que diz respeito à infância. Falam como adultos, brincam como adultos. Crianças que vagam como zumbis, com seus panos na boca e suas garrafas químicas nos bolsos. Não têm pais, são frutos da sociedade. Não têm escola nem casa, apenas um lugar reservado nos presídios e necrotérios.
Que vergonha senti do meu cigarro, do meu prazer em sair para a rua. Que vergonha senti da minha comida, das minhas roupas. Que vergonha senti da minha carteira, da minha civilização, do meu emprego, das minhas preocupações e alegrias idiotas. Que vergonha...

segunda-feira, setembro 11, 2006

Telefone

Este foi, provavelmente, o primeiro conto que escrevi. Só o coloco aqui porque tenho um carinho especial por ele. Esta é a vida a qual nos acostumamos: noites de deriva pelos butecos.
Uma e meia da manhã agora. Andava, sentindo a angústia das quatro paredes de sua jaula. Nada mais que a televisão ou o computador pudessem fazer. Seu cérebro já estava derretido, como o plástico da carteira de cigarros na latinha ardente de álcool. Nem Jimi Hendrix, nem Che Guevara, nem John Lennon, nenhum dos pendurados olhava em seu rosto, ninguém olhava. O telefone quieto, mudo. Os vizinhos não faziam sexo, não usavam drogas. Os discos, arranhados, tão cansados quanto os ouvidos. E frio. E sem cerveja. Acendeu um cigarro antes de ir. Sempre prolongando a dor diminuindo a vida. Mas quem liga?, seremos velhos mesmo.
No corredor do prédio, hospital. Portas de acesso a outras dimensões, mundos paralelos, as portas da percepção da vida real. Triste. O elevador, elevador de merda, trouxe um casal de baratas mortas e um preservativo usado. Pelo menos morreram felizes; e riu sozinho. Oito andares, como demora, porque não cai esta merda, elevador de merda. Luz amarela, suja, espelho rachado, cara rachada, suja da barba, do óleo, da fumaça.
O porteiro da noite olha assustado. Não entende por que, já devia ter se acostumado. Ou existe a esperança que ele não apareça? Do porteiro só lhe incomodava o mate, representação da cartilha dos porteiros:

- Segunda-feira: chimarrão, jornal de domingo, soneca das 2h às 4h.
- Terça-feira: chimarrão, revista Veja, soneca das 2h às 4h.
- Quarta-feira: café, rádio, soneca das 3h às 4h.
- Quinta-feira: chimarrão e café, jornal, revista, rádio, sem soneca.
- Sexta-feira: nada, movimento.

Sempre se complica para abrir o portão do prédio, e o porteiro, tomado de amnésia, deve ser o chimarrão, sempre espera para lhe abrir. A rua, o ar gelado lhe parece mais puro, triste e puro. Acende outro cigarro. Agora só tem mais três, precisa se controlar. Não sente mais os dedos, não tem luvas. Não gosta de luvas, gosta de não sentir os dedos.
Anda, olha e anda. Tudo deserto. Nem cachorros nem táxis, só plantas de vivo acenam pelo vento gelado do Guaíba. Anda, lixo e fezes. Humanas ou caninas não importa, dá tudo na mesma, somos todos iguais, eles menos estúpidos. Mendigo dormindo na calçada, pena por quê? Ele que vá ser mendigo num lugar mais quente, pior que isso não fica.
Objetivo: bar. Bar, restaurante, lancheria, não sabia do que chamar a espelunca engordurada da esquina. Do balcão pegajoso pede sua cerveja. Tudo é pegajoso ali, as prostitutas, o cat-chup, o guardanapo, tudo. Outro casal de baratas cruza a parede à sua frente; será que estas usam camisinha? O gordo vira o hamburger na chapa com os olhos fixos na tela. Todos têm os olhos fixos na tela, bendita tela. No fundo do balcão um sorriso de cinco dentes devora seu X Salada. Esta é a sua tela. Que bizarrice, ela nem percebe, mais uma cerveja. Sua tela acaba o lanche e vai embora, perdeu a graça, ele também vai.
Para onde agora, Bom fim? Segunda não abre o João. Cidade Baixa. A praça também deserta, ninguém se anima a fumar maconha nesse frio, ninguém se anima, a nada. Na zona três carros, sempre três carros. Cerveja de cinco, mulheres de setenta, tudo tem preço. Anda mais, mais uma esquina. Posto de gasolina, aberto, tudo tem preço. Perimetral vazia, igreja fechada, sempre fechada. Atrás do muro só o out-door da Coca-Cola, sempre feliz, sempre aceso, sempre Coca-Cola.
Chega então à Lima e Silva, melancólica de segunda, ressacada do fim de semana. Aqui sim sempre os mesmos, hippies do incenso, vagabundos, alcoólatras, vagabundos alcoólatras, mulheres sedentas, universitários, toda a escória. Nada melhor que rir de seus iguais para esquecer de si mesmo. O chato do violão não desiste nunca. Mesmo assim ele entra, mais um bar, hesita, cerveja, uísque....... cerveja. Senta. Acende um cigarro, agora só restam dois. As conversas das mesas já teve todas. As solidões do balcão já teve todas. Os porres, as risadas, a politicagem, são sempre os mesmos, mudam as vozes.
Maldito seja quem botou o primeiro vilão na mão desse idiota; muda de bar. Mesas vazias, pequenos grupos. Um uísque agora, Natu. Fôda-se; mais um cigarro também, agora só falta um. Um, dois goles, mais um uísque, mais um Natu.
Resolve caminhar um pouco, vagando na sensação de mais uma noite perdida, um pedaço da vida que se escorre. Brinca com o último cigarro da carteira, amanhã é outro dia, sem dinheiro, pior sem cigarros.
Sem querer está em casa. Três e meia agora, hora da soneca. Maldito elevador, elevador de merda. Abre a porta e deita, de roupa, de tênis. Olha as infiltrações que descascam o teto.
Se ela ligasse nada disso teria acontecido.

quinta-feira, setembro 07, 2006

Então tá

Pois bem, não foram poucas as pessoas que deram a dica de fazer um blog. Como eu cansei dessa apurrinhação, aí está. Este primeiro texto é só para dar o tom do que vai ser publicado aqui: as ruas, os bares, a noite, o underground, o Rock and Roll e suas personagens. Como eu sei que serão poucos os leitores, não me preocupo em agradar ninguém. Só espero que você que está lendo tenha pelo menos um momento de prazer ou de reflexão. Ah, e não pensem que sou uma máquina de escrever, é muito provável que esta merda fique dias sem ser modificada. Bueno, era isso que eu queria dizer.

"ROCK É ROCK MESMO!"

Domingo Cinza em Porto Alegre

Domingo cinza em Porto Alegre. Dia de casacos e mãos nos bolsos. Um dia de silêncio. Como são apenas 4h da tarde até mesmo a rodoviária parece quieta. Os ônibus do interior chegam carregados com a noite. Uma multidão de carros laranja aguarda trabalhadores, universitários e alguns poucos turistas. Nos bares os garçons limpam sujeiras imaginárias nas mesas e sentam-se para assistir um pouco de futebol. Na saída uma banca de frutas. Neste momento os cartazes “não mexa” e “não aperte” não falam a ninguém. Nas paradas de ônibus e na passarela nada de gritos e bugigangas. Isqueiros, lanternas, colares, máquinas de cortar cabelo, relógios e vales transporte estão em algum lugar da periferia, descansando, porque amanhã é segunda e todos voltam para as calçadas.
Grandes hotéis disputam lugar com grandes estacionamentos. De todas as alternativas para entrar na cidade a Rua Garibaldi parece a menos atraente. Na primeira quadra dois grandes muros e um hotel com cara de abandonado. Ao atravessar a Rua Voluntários da Pátria, no entanto, um novo mundo.
Na calçada da direita, pequenos cortiços de três andares disfarçam-se de moradia. As pinturas rosa e verde estão pálidas e descascadas. Roupas e cobertores são pendurados nas sacadas. Bandeiras do Brasil, esquecidas desde a Copa do Mundo, também estão ali. Algumas das escadas que levam aos apartamentos têm na sua entrada placas quase ilegíveis: “HOTEL”. Os térreos dão lugar a bares escuros, sujos e enfumaçados, invariavelmente adornados por uma mesa de sinuca, cadeiras de ferro, e rostos sombrios que controlam o movimento da calçada. Toda a atenção está voltada às senhoritas que circulam dez passos a sul, dez a norte, em busca de alguém disposto a alugar um pouco de seu tempo. São as prostitutas de rua, incansáveis em sua jornada, até mesmo num domingo como esse. Seus rostos não demonstram emoção nenhuma. Muita maquiagem para esconder as marcas do vento frio, da idade, da humilhação. Sob as mini-saias as pernas só não estão totalmente expostas por causa das botas de cano longo e das meias-calça. Algumas usam jaqueta, outras blusão de lã. São em torno de dez neste momento, e mesmo assim capazes de satisfazer todos os gostos. Altas, baixas, gordas, magras, loiras, morenas, ruivas. Pela quantia de R$ 20 o cliente pode desfrutar os prazeres do “sexo anal e vaginal, com direito a duas gozadas”. Apesar de tudo elas parecem belas. Talvez porque façam aflorar sentimentos libidinosos; ou por pura pena.
Na esquerda uma fábrica abandonada toma metade da quadra. Logo depois uma pequena porta dá entrada à que provavelmente seja a menor bomboniere da cidade. Num espaço não maior que dois metros quadrados, um senhor gordo e barbudo vende chicletes, chocolates, balas, mandolates, cocadas, cigarros, isqueiros, refrigerantes, enfim, toda essa espécie de artigo. Em dias de semana uma porta lateral é aberta, e o local se transforma em um micro-mercado. Se a fome apertar, o pedestre pode ainda pedir um pastel e um cafezinho por R$ 1. Os próximos trinta metros são um espelho do lado oposto, com seus cortiços, bares e garotas. Quase na esquina um grande galpão desativado serve de depósito para papeleiros. Em dias normais é intenso o fluxo de carrinhos trazendo papéis, latas, garrafas, qualquer coisa que possa ser vendida. Mas hoje é domingo e apenas o zelador está guardando a porta com seu cigarro aceso, olhando as meninas do outro lado. Dentro do galpão uma família descarrega seu primeiro e único carrinho do dia. Uma criança de, no máximo, três anos de idade imita um trânsito com latas de cerveja e constrói uma casa de papelão.
Em meio a tudo isso, uma igreja. Afinal, o “Sagrado Coração de Jesus” precisa ficar perto dos pecadores mais honestos.