M. era uma menina comum. Gostava de sair à noite, curtir um rock e confraternizar com os amigos. Durante a faculdade formou uma boa turma e conheceu seu namorado. Sempre apreciou as coisas simples da vida: uma volta na Redenção em dias de sol, Gasômetro no fim da tarde, sorvete no Jóia, cervejadinha no João, no Marinho, no Rossi, no Adriano, no Bell's, ficar sem fazer nada, andar à deriva pelo Centro de Porto Alegre, praia, qualquer uma, até Capão no verão. Mora com sua mãe num apartamento simples, mas aconchegante. Seu projeto de vida? Viver.
H.G. é um dos mais respeitados empresários do Rio Grande do Sul. Para eles. Um legítimo representante da turma dos carros importados. Mais que isso, um dos líderes. Seu faturamento gira em torno dos milhões de reais. Se no fim do mês a conta apresenta uma queda nos lucros, não hesita em demitir o pessoal do salário mínimo. É conhecido pelo stress que provoca nos funcionários, pressão, desconforto, medo. Separou-se de sua mulher e é obrigado a conviver com a indiferença da filha. Seu projeto de vida? Acumular mais e mais dinheiro.
M. se formou na faculdade. Depois de alguns meses circulando quadrados nos classificados, conseguiu um emprego. Salário bom para quem está começando, rancho no fim do mês, vale transporte, ou seja, mais um número nas estatísticas de emprego formal do governo.
Mas não demorou muito para ela perceber como são tratados os escravos modernos. Ela, uma das melhores funcionárias da sua área no Brasil, passou a viver sob uma tortura psicológica constante. Na sua sala todos suavam sangue para agradar e sustentar as loucuras do chefe. Sempre o risco de uma demissão sumária, ou de tomar um esporro sem ter feito nada, ou mesmo de agressão física, como chegou a acontecer com M.
Eis que um belo dia ela decidiu: "não quero mais".
Saiu aflita de casa, pois falar com o tal de H.G. é sempre um teste de nervos. Seu chefe direto não teve capacidade de resolver nada, então foi obrigada a marcar essa hora com o chefe de todos. Entrou na sala com o semblante decidido, ele com cara de poucos amigos.
-Eu gostaria que o senhor me demitisse.
-Mas por que sair? Não estás satisfeita com teu trabalho?
-Não, eu quero fazer outras coisas da minha vida.
-Eu dobro o teu salário.
-Não, eu quero mesmo é sair daqui.
-Eu triplico o teu salário.
-Não, o senhor não está entendendo, eu não quero mais trabalhar nessa empresa.
-Eu triplico o teu salário e pago uma pós-graduação.
-O senhor realmente não está entendendo: EU NÃO QUERO MAIS TRABALHAR AQUI!!!
Nesse mesmo dia M. assinou os papéis de sua demissão. Ela voltou a ser feliz. De noite saiu para confraternizar e assistir um show de rock com seus amigos.
Mas M. não é mais uma menina comum. Ela conseguiu provar para um grande filho da puta que não são todas as pessoas que se vendem por dinheiro. Que ainda existe gente que valoriza a vida e toda a complexidade de suas coisas simples: uma volta na Redenção em dias de sol, Gasômetro no fim da tarde, sorvete no Jóia, cervejadinha no João, no Marinho, no Rossi, no Adriano, no Bell's, ficar sem fazer nada, andar à deriva pelo Centro de Porto Alegre, praia, qualquer uma, até Capão no verão.....
H.G. é um dos mais respeitados empresários do Rio Grande do Sul. Para eles. Um legítimo representante da turma dos carros importados. Mais que isso, um dos líderes. Seu faturamento gira em torno dos milhões de reais. Se no fim do mês a conta apresenta uma queda nos lucros, não hesita em demitir o pessoal do salário mínimo. É conhecido pelo stress que provoca nos funcionários, pressão, desconforto, medo. Separou-se de sua mulher e é obrigado a conviver com a indiferença da filha. Seu projeto de vida? Acumular mais e mais dinheiro.
M. se formou na faculdade. Depois de alguns meses circulando quadrados nos classificados, conseguiu um emprego. Salário bom para quem está começando, rancho no fim do mês, vale transporte, ou seja, mais um número nas estatísticas de emprego formal do governo.
Mas não demorou muito para ela perceber como são tratados os escravos modernos. Ela, uma das melhores funcionárias da sua área no Brasil, passou a viver sob uma tortura psicológica constante. Na sua sala todos suavam sangue para agradar e sustentar as loucuras do chefe. Sempre o risco de uma demissão sumária, ou de tomar um esporro sem ter feito nada, ou mesmo de agressão física, como chegou a acontecer com M.
Eis que um belo dia ela decidiu: "não quero mais".
Saiu aflita de casa, pois falar com o tal de H.G. é sempre um teste de nervos. Seu chefe direto não teve capacidade de resolver nada, então foi obrigada a marcar essa hora com o chefe de todos. Entrou na sala com o semblante decidido, ele com cara de poucos amigos.
-Eu gostaria que o senhor me demitisse.
-Mas por que sair? Não estás satisfeita com teu trabalho?
-Não, eu quero fazer outras coisas da minha vida.
-Eu dobro o teu salário.
-Não, eu quero mesmo é sair daqui.
-Eu triplico o teu salário.
-Não, o senhor não está entendendo, eu não quero mais trabalhar nessa empresa.
-Eu triplico o teu salário e pago uma pós-graduação.
-O senhor realmente não está entendendo: EU NÃO QUERO MAIS TRABALHAR AQUI!!!
Nesse mesmo dia M. assinou os papéis de sua demissão. Ela voltou a ser feliz. De noite saiu para confraternizar e assistir um show de rock com seus amigos.
Mas M. não é mais uma menina comum. Ela conseguiu provar para um grande filho da puta que não são todas as pessoas que se vendem por dinheiro. Que ainda existe gente que valoriza a vida e toda a complexidade de suas coisas simples: uma volta na Redenção em dias de sol, Gasômetro no fim da tarde, sorvete no Jóia, cervejadinha no João, no Marinho, no Rossi, no Adriano, no Bell's, ficar sem fazer nada, andar à deriva pelo Centro de Porto Alegre, praia, qualquer uma, até Capão no verão.....