Com um exemplo, pretendo dizer tudo o que penso sobre a tecnologia. Um dia combinamos de tocar com os amigos da Road House Band, Daniel (vocalista) e Iguana (baterista). O Nano, que é o Daniel, e fã incondicional de Jim Morrison, trouxe um CD com toda a discografia do Doors, incluindo raridades e discos ao vivo.
Chega a ser assustador. O trabalho de uma vida. Juntar toda uma discografia, ou pelo menos o suficiente para ter noção de que nunca estaria completa, era coisa de aficcionado. Eu, por exemplo, passei anos colecionando discos do Doors. Nunca tive o "The Soft Parade". Durante a juventude me considerava o fã número um dos Ramones, mas nunca tive o "Half Way To Sanity". Só uma fita que um amigo gravou. Isso para dizer que hoje o disco perdeu o valor que tinha naquela época. Um sacrifício. Horas e horas em lojas. O cara era amigo do vendedor de discos assim como do livreiro. E o vendedor de discos era o cara que mais sabia de música, assim como o livreiro sabe de livros. Na verdade essa relação ainda existe, mas continuam sendo os mesmos aficcionados do tempo em que era generalizada a relação das pessoas com os discos e as lojas de disco. É só passar na frente de uma. Vazias. Todas as lojas de disco estão vazias.
Mas isso é só uma constatação. Eu considero uma grande vantagem, a tecnologia. Há alguns dias chegou aqui em casa um disco do Lynard Skynard. Sem contar da que já pode ser chamada coleção de discos de Blues. Os sete primeiros discos do Elvis. Toda a discografia da Janis, do Raul, do Casa das Máquinas. Jefferson Airplane, ZZ Top, Legião Urbana, Kiss, David Bowie. Qualquer coisa. Uma revolução, overdose de Rock'n'Roll. Acho até que precisamos criar mais cursos de Rock por aí. Já tem aquela faculdade da Unisinos. Tem alguns almoços temáticos no Studio Clio. Mas os cursos têm que exigir uma carga horária de aulas práticas maior do que teoricas. Uma pessoa nunca vai ser Rocker só conhecendo todas as bandas de Rock. O candidato a Rocker tem que enfrentar a noite. Economia não explica a arte da sobrevivência depois do dia 15, quando o cara provavelmente já gastou todo seu dinheiro no bar. A antropologia ainda não sabe explicar a maneira de conversar com o bandido para não ser assaltado. Só com muito treino o candidato a Rocker consegue beber parelho a noite toda e não fazer papelão nas festas. Se contarmos que o Keith Richards ainda faz os dele, talvez essa seja uma coisa impossível de aprender. Sem essa vivência não vai adiantar de nada o acesso a todos os discos de Rock.
Na verdade essa reflexão toda veio depois de perceber que Jim Morrison não é cantor, e sim um declamador de poesias que se empolgava e saía gritando por aí. "An American Prayer" é um excelente disco. Outro que eu não tinha do Doors; só ouvia na casa de amigos. Agora é obrigatória a aquisição do livro do Jim que tem pelos sebos da cidade. E depois dizem que o cara não era nada, que não fazia literatura. Legítimo preconceito. Jim Morrison é a marca de uma geração, sem exageros. É um Jack Kerouak, um Hemingway. Não conheço os poetas norte americanos. Por que Cazuza é poeta e Jim Morrison não? Eu sei que não tem comparação, mas penso como um brasileiro.
Temos que entender que Jim Morrison é um poeta para aproveitar os discos que a tecnologia nos proporciona.
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